O governo apresentou e a Câmara dos Deputados aprovou o vergonhoso Projeto de Lei que permite às pessoas penhorarem seus imóveis, mesmo que tenham apenas um, para receber empréstimos a juros mais baixos.
Aprovado por 260 votos favoráveis e 111 contrários (da oposição), o PL 4188/21 cria o marco legal das garantias de empréstimos e altera a Lei 8.009/1990, que trata da impenhorabilidade. Segundo esta lei, “imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam”.
Corretamente, a legislação atual impede que uma família perca seu único bem para o pagamento de dívidas. Hoje, o imóvel usado como residência, se único, só pode ser garantia de financiamento do próprio imóvel e leiloado, em caso de inadimplência do financiamento imobiliário.
Com a proposta aprovada na Câmara, o governo pretende que pessoas físicas ou jurídicas interessadas em tomar empréstimo junto aos bancos deverão firmar um contrato com uma das Instituições Gestoras de Garantia (IGG), para quem devem apresentar os bens que pretendem dar em garantia, que avaliará o valor e os riscos e definirá o valor máximo do empréstimo. Só após o contrato firmado com uma dessas empresas o interessado poderá ir à instituição financeira em busca do empréstimo.
Deixar as pessoas oferecerem a casa onde moram a troco de um empréstimo é uma medida cruel, pois incentiva as pessoas a se endividarem usando essa garantia, num momento em que muita gente está tomando dinheiro emprestado para as necessidades básicas, inclusive comprar comida. Essa proposta vem no momento em que o país passa por uma grande crise, com alto índice de desemprego, inflação altíssima e preços dos alimentos proibitivos, o que leva mais de 33 milhões de brasileiros a passarem fome, segundo pesquisa divulgada ontem (7/6).
Depois de acabar com o Minha Casa Minha Vida, agora Bolsonaro quer incentivar empréstimos impagáveis, dando como garantia o lar de quem ainda tem. Com isso, vai aumentar o absurdo número de pessoas que já vivem na rua, sem um lugar para morar.
A projeção mais recente de moradores de rua foi divulgada em março de 2020 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), com 221.869 brasileiros vivendo nas ruas naquele ano, o equivalente a cerca de 0,1% da população total do país. A pandemia já fez muita gente perder o seu lar.
E o índice de endividamento das famílias já é muito alto. A Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic) da Confederação Nacional do Comércio (CNC), mostra que 77% das famílias estão endividadas. É o maior percentual desde que começou a ser realizada, em janeiro de 2010. Em abril do ano passado, o número de endividados chegava a 67,5% do total.
A proposta ainda precisa ser aprovada no Senado, e esperamos que não seja, para que comece a valer. É uma armadilha para as pessoas estão sem emprego ou ganhando pouco e, numa situação de desespero acabam se endividando com a garantia do único bem que possuem.
Vamos trabalhar para esse projeto de lei seja rejeitado no Senado. Esperamos que os senadores tenham mais humanidade e salvem os brasileiros de mais essa crueldade de Bolsonaro.
*Vanessa Grazziotin é ex-senadora da República e membro do Comitê Central do PCdoB.