Caso deve ser apreciado pelo ministro Flávio Dino, relator das ações que tratam do orçamento secreto
A bancada do PSOL na Câmara dos Deputados ingressou, na noite desta terça-feira (17), com um mandado de segurança junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) para pedir a anulação de um ato de Arthur Lira (PP-AL) que ampliou o controle pessoal do presidente da Casa e de líderes partidários sobre o destino de emendas parlamentares.
Mandado de segurança do PSOL
A ação do partido pede que a Corte torne ilegal ofício sigiloso enviado na última quinta (12) por 17 líderes para o Poder Executivo solicitando inclusão direta de 5.449 indicações de emendas que não têm registro em atas nem passaram por deliberação formal, conforme exigem as regras. Os valores envolvidos chegam a R$ 4,2 bilhões.
O documento é assinado pelos líderes das siglas PSDB, PDT, PL, PP, PRD, Republicanos, Avante, PSD, Cidadania, Solidariedade, União Brasil, PSB, MDB, PV, Podemos e pelas próprias lideranças do PT e do governo Lula. O envio do ofício teria sido articulado por Arthur Lira, segundo reportagem da revista Piauí na segunda (16). A iniciativa estaria articulada com ato assinado pelo pepista no mesmo dia: na quinta, Lira determinou o cancelamento de todas as agendas de comissões legislativas até o final do ano alegando que os trabalhos seriam concentrados no plenário.
Segundo as investigações da Piauí, a medida se deu para impedir que os integrantes das comissões deliberassem sobre o destino das emendas, o que favoreceria o remanejo dos valores segundo a vontade de Lira e dos demais signatários do ofício. Por trás disso estaria o interesse do presidente da Câmara de capturar boa parte dos valores de emendas da Comissão de Integração Nacional para o estado onde tem base eleitoral, Alagoas. A informação foi denunciada em público nos últimos dias pelo presidente do colegiado, José Rocha (União-BA), segundo o qual a comissão teria em jogo R$ 1,125 bilhão.
Capitaneada pelo deputado Glauber Braga (RJ), presidente da Comissão de Legislação Participativa (CLP), a ação do Psol aponta que a iniciativa de Lira substitui de forma “indevida” a deliberação formal das comissões permanentes, que são “as instâncias competentes para analisar e aprovar as emendas de comissão”. “A ausência de aprovação prévia e registro formal pelas comissões configura usurpação de competência e descumprimento do rito legal, comprometendo a transparência e a rastreabilidade necessárias à execução orçamentária. Tal conduta afronta ainda as decisões proferidas pela Corte no âmbito da ADPF [Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental] 854, que vedam a destinação de recursos sem transparência formal e identificação dos responsáveis”, argumenta o partido no documento.
A sigla aponta que o ofício assinado pelas lideranças é marcado por alegações falsas. “Alegaram falsamente que se tratava de mera ‘ratificação’ de indicações previamente aprovadas pelas comissões permanentes. Contudo, o exame do conteúdo revela irregularidades substanciais que evidenciam a falsidade material do argumento apresentado”, indica a ação, ao citar que houve ‘exclusões indevidas de emendas previamente aprovadas pelas comissões, alterações injustificadas em indicações no valor de R$ 96 milhões e inclusão de novas indicações ilegais, no montante de R$ 180 milhões, sem qualquer deliberação ou registro formal em atas pelas comissões competentes'”
“Estamos solicitando que o STF torne ilegal e suspenda imediatamente os efeitos desse ofício que foi encaminhado ao Executivo. Desrespeitar uma decisão do STF e a legislação complementar que foi aprovada na própria Câmara e que fala da necessidade de transparência em relação às emendas pra priorizar emendas ilegais e, mais do que isso, boa parte deles voltadas pro estado do presidente da Câmara sem a autorização prévia das comissões e cancelando as comissões temáticas pra que essa fraude pudesse ser operada, não nos parece nada razoável. Pelo contrário, é uma enorme ilegalidade”, disse Braga, em coletiva de imprensa.
A deputada Luiza Erundina (Psol-SP) destacou que a atitude de Lira de suspender os colegiados para assumir maior controle sobre o orçamento não só exclui a maioria dos parlamentares das decisões sobre os rumos das emendas como também impede a participação da sociedade no processo de alocação do dinheiro público, já que são as comissões que promovem audiências públicas e diálogos multilaterais com setores civis.
“Queria registrar que nunca vi uma legislatura em que as comissões de mérito, que são aquelas que apreciam os temas e decidem sobre eles antes de irem a plenário, não funcionam mais. Tudo vai direto a plenário. O espaço pra que os deputados possam se pronunciar e contribuir pra as decisões de mérito das matérias não estão se dando mais, muito menos para [participação da] sociedade civil. Esse fato que está sendo denunciado aqui hoje é um dos que mostram como a democracia é desrespeitada nesta Casa. É inaceitável. Isso tem que mudar.”
Trâmite
O pedido encaminhado pelo Psol ao STF será anexado às ações que tratam do orçamento secreto, que estão sob a relatoria do ministro Flávio Dino. Se a Corte acatar o pedido, em tese, as comissões teriam que voltar a se reunir para fecharem as deliberações sobre o destino das emendas parlamentares.
Mesmo com o recesso legislativo prestes a começar – o Congresso só trabalha até esta sexta (20) e retorna em fevereiro –, Glauber Braga acredita que os parlamentares conseguiriam dar conta da demanda em tempo hábil. “Acredito que daria tempo, sim, mesmo que fosse necessário estender a agenda legislativa, já que o Orçamento ainda não foi votado e a Constituição diz que o ano legislativo só acaba com a aprovação do orçamento”, disse ao “Brasil de Fato”.
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